Imagine uma planta de aparência aveludada, com flores suaves que variam do branco ao rosa-pálido, cujas raízes guardam um segredo doce e curativo. Essa é a alteia, mais conhecida pelo seu nome em inglês, marshmallow. Seu nome científico, Althaea officinalis, deriva do grego “altho”, que significa “curar”, um testemunho de seu prestígio como uma planta medicinal desde a antiguidade. Famosa por sua capacidade de acalmar a tosse e proteger as mucosas, a alteia era tão valorizada que os egípcios a reservavam para deuses e reis, e os franceses a transformaram no precursor do doce marshmallow que conhecemos hoje.
Neste guia completo, vamos desvendar o universo da alteia, explorando desde seu uso histórico como alimento e remédio até as mais recentes validações científicas de suas propriedades. Você descobrirá por que suas raízes, ricas em uma substância gelatinosa chamada mucilagem, são um bálsamo para os sistemas respiratório e digestivo.
Vamos detalhar como essa planta pode aliviar desde uma simples dor de garganta até condições mais complexas como gastrite e irritações de pele, e como usá-la de forma segura e eficaz em chás, xaropes e cataplasmas. Prepare-se para conhecer a história, a ciência e os segredos da planta que oferece um abraço suave e curativo por dentro e por fora.
QUIZ - Descubra o Seu Chá Ideal
Nomes Populares
- Português: Alteia, Malva-branca, Malvaísco, Marshmallow
- Espanhol: Altea, Malvavisco, Bismalva
- Inglês: Marshmallow, Marsh Mallow, White Mallow
- Francês: Guimauve officinale, Guimauve sauvage
- Italiano: Altea comune, Bismalva
- Alemão: Echter Eibisch
Família Botânica
Althaea officinalis L. (Malvaceae) é uma planta herbácea perene que pode atingir até 1,5 metros de altura. Possui um caule ereto e robusto, coberto por uma densa pilosidade que lhe confere uma textura aveludada. As folhas são alternadas, pecioladas, com formato de coração (cordiformes) e margens dentadas. As flores, que surgem no verão, são de cor branca a rosa-pálido, com cinco pétalas e um centro púrpura. A raiz é pivotante, longa e espessa, de cor amarelada, sendo a parte mais rica em mucilagem (até 35%). A planta é nativa da Europa e Ásia Ocidental, crescendo em locais úmidos como pântanos, margens de rios e prados úmidos. Floresce de junho a setembro no Hemisfério Norte.
A Althaea officinalis pertence à nobre família Malvaceae, a mesma do hibisco, do quiabo e do algodão. Esta família é famosa por suas plantas ricas em mucilagem, uma substância gelatinosa com incríveis propriedades emolientes e protetoras. A presença dessa mucilagem é a assinatura da família e a principal responsável pelos benefícios da alteia para a saúde, conferindo-lhe a capacidade única de acalmar e revestir tecidos inflamados, desde a garganta até o estômago.
Partes Usadas
- Raiz (principalmente)
- Folhas
- Flores
Usos Etnobotânicos
- Abscessos
- Asma
- Azia e queimação
- Bronquite
- Cistite (inflamação da bexiga)
- Dermatite e eczema
- Diarreia
- Dor de dente
- Dor de garganta
- Furunculos e feridas
- Gastrite e úlceras pépticas
- Picadas de insetos
- Queimaduras leves
- Síndrome do Intestino Irritável (SII)
- Tosse seca e irritativa
- Úlceras varicosas
Propriedades Medicinais
- Analgésica: (alivia a dor, especialmente de mucosas inflamadas)
- Antibacteriana: (inibe o crescimento de certas bactérias)
- Anti-inflamatória: (reduz a inflamação, especialmente das mucosas respiratória, gástrica e urinária)
- Antioxidante: (protege as células contra os danos dos radicais livres)
- Antitussígena: (suprime a tosse, especialmente a seca e irritativa)
- Cicatrizante: (acelera a regeneração de tecidos e a cicatrização de feridas)
- Demulcente: (forma uma camada protetora sobre as mucosas, acalmando a irritação)
- Diurética: (aumenta a produção de urina, ajudando a limpar o trato urinário)
- Emoliente: (amacia e suaviza a pele e tecidos inflamados)
- Expectorante: (ajuda a fluidificar e soltar o muco dos pulmões)
- Galactagoga: (pode estimular a produção de leite materno)
- Hipoglicemiante: (ajuda a reduzir os níveis de açúcar no sangue)
- Imunomoduladora: (estimula a atividade das células de defesa do corpo)
- Laxante Suave: (a mucilagem ajuda a lubrificar o intestino e a aliviar a constipação)
Sinergia com Outras Plantas
As flores da alteia, delicadas e suaves, contêm flavonoides e mucilagem, contribuindo para as propriedades anti-inflamatórias e emolientes da planta. Embora a raiz seja a parte mais potente, as flores são usadas em infusões para acalmar a pele e tratar irritações oculares leves, oferecendo uma ação mais suave, ideal para complementar a força da raiz.
Alteia e Alcaçuz (Glycyrrhiza glabra)
Nível de sinergia: ★★★★★
A combinação clássica e imbatível para a saúde respiratória. A alteia cria uma camada protetora que acalma a tosse seca, enquanto o alcaçuz atua como um poderoso expectorante e anti-inflamatório, ajudando a soltar o muco e a reduzir a inflamação dos brônquios. Juntas, oferecem um alívio completo para tosses, bronquites e dores de garganta.
Alteia e Camomila (Matricaria chamomilla)
Nível de sinergia: ★★★★★
A dupla perfeita para acalmar o sistema digestivo. A mucilagem da alteia reveste e protege a mucosa do estômago e do intestino, aliviando gastrite e úlceras. A camomila complementa com sua ação anti-inflamatória, antiespasmódica e calmante, aliviando cólicas e promovendo o bem-estar digestivo. É a combinação ideal para a síndrome do intestino irritável.
Alteia e Calêndula (Calendula officinalis)
Nível de sinergia: ★★★★★
Uma aliança poderosa para a regeneração da pele. A alteia hidrata e forma uma barreira protetora, enquanto a calêndula, uma mestra na cicatrização, acelera a reparação dos tecidos, combate bactérias e reduz a inflamação. Juntas, são perfeitas em cremes ou cataplasmas para tratar feridas, queimaduras, eczema, dermatite e pele seca.
Alteia e Equinácea (Echinacea purpurea)
Nível de sinergia: ★★★★☆
Uma barreira de defesa para o sistema imunológico. A equinácea estimula as células de defesa, enquanto a alteia não só possui atividade imunomoduladora, mas também alivia os sintomas de gripes e resfriados, como a dor de garganta e a tosse. É uma estratégia dupla: fortalecer o exército interno e acalmar o campo de batalha.
Alteia e Tanchagem (Plantago major)
Nível de sinergia: ★★★★☆
Duas mestras da mucilagem unidas. A tanchagem, assim como a alteia, é rica em polissacarídeos que acalmam e protegem as mucosas. Juntas, elas potencializam o efeito demulcente, sendo extremamente eficazes para tratar tosses persistentes, irritações na garganta e inflamações no trato digestivo. É uma sinergia que duplica a camada de proteção e cuidado.
Alteia e Tomilho (Thymus vulgaris)
Nível de sinergia: ★★★★☆
A combinação ideal para tosses produtivas. A alteia acalma a irritação que causa o reflexo da tosse, enquanto o tomilho, um poderoso antisséptico e expectorante, combate a infecção e ajuda a fluidificar e eliminar o catarro. Uma acalma, a outra limpa, resultando em um tratamento completo para infecções respiratórias.
Alteia e Ulmária (Filipendula ulmaria)
Nível de sinergia: ★★★☆☆
Uma parceria estratégica para o estômago. A ulmária (ou rainha-dos-prados) é conhecida por sua capacidade de neutralizar o excesso de ácido no estômago, enquanto a alteia protege as paredes do estômago contra a agressão ácida. Juntas, elas oferecem um alívio eficaz para azia, queimação e gastrite, tratando tanto a causa (excesso de ácido) quanto o sintoma (dor e inflamação).
Composição Científica (Fitoquímicos)
- Mucilagem (até 35% na raiz): Polissacarídeos complexos (galacturonorramnanas, arabinogalactanas) responsáveis pelos efeitos demulcente, emoliente e antitussígeno.
- Flavonoides: Hipolaetina-8-glucosídeo, isoquercitrina, quercetina, kaempferol, com ação antioxidante e anti-inflamatória.
- Ácidos Fenólicos: Ácido cafeico, ácido clorogênico, ácido p-cumárico, ácido siríngico.
- Cumarinas: Escopoletina.
- Pectina (cerca de 11%): Contribui para a viscosidade da mucilagem.
- Amido (25-35%): Fonte de energia e componente da raiz.
- Aminoácidos: Asparagina.
- Taninos: Presentes em menor quantidade.
Contraindicações e Precauções
- Alergia: Pessoas com alergia conhecida a plantas da família Malvaceae devem ter cautela.
- Diabetes: A alteia pode baixar os níveis de açúcar no sangue. Pacientes diabéticos devem monitorar a glicemia e consultar um médico antes do uso.
- Gravidez e Amamentação: Embora tradicionalmente usada, a segurança não foi formalmente estabelecida. O uso deve ser feito sob orientação médica.
- Interações Medicamentosas: A mucilagem pode retardar a absorção de outros medicamentos, vitaminas ou minerais. Recomenda-se tomar a alteia pelo menos 2 horas antes ou depois de qualquer outra medicação ou suplemento.
- Cirurgias: Por seu efeito hipoglicemiante, o uso de alteia deve ser interrompido pelo menos 2 semanas antes de qualquer procedimento cirúrgico.
Modo de Uso (Receitas)
A raiz de alteia seca é a parte mais valiosa da planta medicinal. Rica em mucilagem, polissacarídeos e flavonoides, ela é a base para a maioria das preparações terapêuticas. A maceração a frio da raiz libera a mucilagem sem degradá-la, criando um líquido viscoso ideal para tratar tosse, dor de garganta e problemas gástricos. O pó da raiz é usado em cataplasmas para a pele.
Infusão a Frio (Maceração) para Tosse e Saúde Digestiva
Esta é a melhor forma de extrair a mucilagem da raiz. O líquido resultante é um bálsamo para a garganta, estômago e intestinos.
Ingredientes:
- 1 colher de sopa de raiz de alteia seca e picada
- 250 ml de água em temperatura ambiente
Modo de Preparo:
- Coloque a raiz de alteia em um copo ou jarra com a água.
- Deixe de molho (macerando) por pelo menos 4 horas, ou idealmente, durante a noite.
- Você notará que a água se tornará mais espessa e ligeiramente gelatinosa.
- Coe o líquido e beba ao longo do dia, em pequenos goles.
- Pode ser aquecido levemente (sem ferver) antes de beber, se preferir.
Cataplasma para Pele Irritada, Furúnculos e Feridas
Este cataplasma acalma a inflamação, puxa as impurezas e acelera a cicatrização.
Ingredientes:
- 2 colheres de sopa de pó de raiz de alteia
- Água morna
Modo de Preparo:
- Em uma tigela pequena, adicione a água morna ao pó de alteia aos poucos, mexendo sempre, até formar uma pasta espessa e homogênea.
- Aplique a pasta diretamente sobre a área afetada.
- Cubra com uma gaze ou um pano limpo.
- Deixe agir por 1 a 2 horas.
- Lave suavemente com água morna. Repita 2 vezes ao dia, se necessário.
Chá Quente de Folhas e Flores para o Trato Urinário
A infusão quente das folhas e flores tem uma ação diurética suave e calmante, ideal para cistites e irritações do trato urinário.
Ingredientes:
- 1 colher de sopa de folhas e flores de alteia secas
- 250 ml de água
Modo de Preparo:
- Ferva a água.
- Despeje a água fervente sobre as folhas e flores em uma xícara.
- Tampe e deixe em infusão por 10 a 15 minutos.
- Coe e beba morno.
- Tome de 2 a 3 xícaras por dia.
Curiosidades
As folhas da alteia, com sua textura aveludada característica, também possuem propriedades medicinais. Embora contenham menos mucilagem que a raiz, são ricas em flavonoides e são tradicionalmente usadas em infusões para problemas do trato urinário e como emoliente suave para a pele.
O Doce dos Deuses e Reis
A mais famosa curiosidade é a origem do doce marshmallow. No Egito Antigo, a mistura da seiva da raiz de alteia com mel era uma iguaria reservada exclusivamente para a realeza e para oferendas aos deuses. Séculos depois, no século XIX, os confeiteiros franceses aprimoraram a receita, batendo a seiva da raiz com açúcar e claras de ovo para criar o “Pâte de Guimauve”, o ancestral direto do marshmallow moderno, que era vendido tanto como doce quanto como remédio para dor de garganta.
Comida de Sobrevivência
Em tempos de fome, a alteia era uma fonte de nutrição vital. O historiador romano Plínio, o Velho, escreveu que “quem tomar uma colher de malva (alteia) por dia, ficará livre de todas as doenças”. Suas raízes, ricas em amido, eram cozidas, fritas ou assadas, fornecendo o sustento necessário para muitas comunidades ao longo da história.
Um Símbolo de Gentileza
Na linguagem vitoriana das flores, a alteia, com sua aparência suave e aveludada, era um símbolo de benevolência, gentileza e persuasão. Oferecer um ramo de alteia era uma forma de enviar uma mensagem de carinho, um pedido de desculpas ou um convite para ser persuadido por um argumento gentil.
Adesivo e Lubrificante
A mucilagem da alteia não era usada apenas para fins medicinais. Sua natureza pegajosa a tornava um excelente adesivo natural, usado para colar papiro. Além disso, era aplicada em ferramentas e eixos de carroças como um lubrificante para reduzir o atrito.
O Teste da Tosse
Na medicina popular, havia um ditado que dizia que a alteia era “o teste da tosse”. Se uma pessoa com tosse não encontrasse alívio com a alteia, acreditava-se que a causa da tosse não era física, mas sim de origem nervosa ou emocional, indicando a profunda confiança em sua eficácia para problemas respiratórios.
As sementes da alteia são pequenas e de formato circular, contidas em cápsulas que se formam após a floração. Embora não sejam a parte mais utilizada medicinalmente, as sementes são importantes para a propagação da planta e podem ser cultivadas em jardins domésticos, desde que haja condições adequadas de umidade.
Perguntas Frequentes (FAQ)
Qual a diferença entre usar a raiz e as folhas da alteia?
A raiz é a parte mais rica em mucilagem (até 35%), sendo a mais potente e indicada para problemas digestivos (gastrite, úlceras) e respiratórios (tosse seca, dor de garganta). As folhas e flores contêm menos mucilagem, mas são ricas em flavonoides, tendo uma ação diurética e anti-inflamatória mais pronunciada, sendo ideais para infusões quentes para o trato urinário e para a pele.
Posso fazer xarope para tosse com alteia em casa?
Sim. Você pode fazer uma decocção concentrada da raiz (fervendo-a lentamente em água por 15-20 minutos), coar muito bem e depois misturar o líquido com mel em partes iguais (por exemplo, 100 ml de chá para 100g de mel). Guarde na geladeira por até duas semanas. Este xarope é um excelente remédio caseiro para tosse e dor de garganta.
Alteia é segura para crianças?
Sim, a alteia é considerada uma das plantas medicinais mais seguras para crianças. O xarope de alteia é tradicionalmente usado para tratar tosse e dor de dente em bebês. No entanto, é sempre fundamental seguir as dosagens adequadas para a idade e consultar um pediatra antes de usar.
O chá de alteia tem um gosto bom?
A maceração a frio da raiz de alteia tem um sabor suave, levemente adocicado e uma textura um pouco espessa, que muitas pessoas acham agradável. Não é um chá amargo. A infusão das folhas e flores tem um sabor mais herbal e suave.
Alteia pode ajudar na Síndrome do Intestino Irritável (SII)?
Sim, a alteia é uma das plantas mais recomendadas para a SII. Sua mucilagem reveste o intestino, protegendo-o da irritação, reduzindo a inflamação e ajudando a regular a função intestinal, podendo aliviar tanto a diarreia quanto a constipação associadas à síndrome.
Como a alteia ajuda a curar feridas na pele?
Aplicada como cataplasma, a alteia faz três coisas: 1) a mucilagem mantém a ferida úmida, o que acelera a cicatrização; 2) seus polissacarídeos estimulam a atividade das células da pele (fibroblastos) para reparar o tecido; e 3) suas propriedades anti-inflamatórias reduzem o inchaço e a vermelhidão ao redor da ferida.
Onde posso comprar alteia de boa qualidade?
Procure por raiz de alteia seca e picada (não em pó, se possível, para garantir a identidade) em lojas de produtos naturais e ervanários de confiança. Certifique-se de que o produto tem uma aparência limpa, cor clara e um cheiro suave e adocicado. Fornecedores que realizam testes de qualidade são sempre a melhor opção.
Referências Científicas
- Bonaterra, G. A., et al. “Anti-inflammatory and Anti-oxidative Effects of Phytohustil® and Root Extract of Althaea officinalis L. on Macrophages in vitro.” Frontiers in Pharmacology, vol. 11, 2020, p. 290.
- Banaee, M., et al. “Therapeutic effects of marshmallow (Althaea officinalis L.) extract on plasma biochemical parameters of common carp infected with Aeromonas hydrophila.” Veterinary Research Forum, vol. 8, no. 2, 2017, pp. 145-153.
- Hage-Sleiman, R., et al. “Pharmacological evaluation of aqueous extract of Althaea officinalis flower grown in Lebanon.” Pharmaceutical Biology, vol. 49, no. 3, 2011, pp. 327-33.
- Baimakhanov, B., et al. “Phytochemical compounds and biomedical properties of Althaea officinalis.” Pharmacy Practice, vol. 21, no. 3, 2023, p. 3153.
- Xue, T., et al. “Isolation, structural properties, and bioactivities of polysaccharides from Althaea officinalis Linn.: A review.” International Journal of Biological Macromolecules, vol. 242, pt. 4, 2023, p. 125098.
- Rezaei, M., et al. “A review on pharmacological activities and health effects of marshmallow (Althaea officinalis L.).” Journal of Herbmed Pharmacology, vol. 4, no. 2, 2015, pp. 53-60.
- Sadighara, P., et al. “The antioxidant and Flavonoid content of the leaves of Althaea officinalis L.” Avicenna Journal of Phytomedicine, vol. 2, no. 3, 2012, pp. 126-131.
